Os amigos são para a vida.

Mesmo que não o saibam, mesmo que não façam permanentemente parte dela, mesmo que não o escolham. Os amigos são para a vida, e os meus são assim.

Não sou de muitos amigos. Incomodam-me os salamaleques iniciais. Os juízos e os julgamentos, as ponderações e as medições. Aborrecem-me os protocolos, os caminhos mais trilhados e os pressupostos em que as amizades se fundam. Entedia-me o morno, o mais ou menos, o vamos ver se sim ou se não.

Interessam-me as pessoas, as histórias e narrativas interiores, os universos únicos e fechados, o “diamante dentro do lótus”.

E comigo é tudo ou nada. Não há essa coisa do meio termo, das cinquenta sombras de qualquer coisa, do diz que disse, do chove não molha.

Ser meu amigo não é fácil. Não há testes ou período experimental. Não há voltar atrás ou mudar de ideias. Ou é intensamente ou nem vale a pena darem-se ao trabalho.

Eu vou com tudo. E isso assusta. Eu mostro as cartas antes do jogo começar e isso muda as regras. Eu não estou para bluffs, fingimentos, suponhamos, “what if’s”, e nem todos estão para isso. E está tudo bem.

A Lena Dunham partilhou isto:

E eu percebo-a perfeitamente. Podíamos facilmente ser amigas. Não há demasiado entre os amigos. Ou há tudo, ou não há nada. E só assim faz sentido.

Por isso os meus amigos são para a vida. Porque com todos eles existiu nalgum momento um elo que suplantou o tempo / o espaço / o contexto, e a nossa própria existência. Porque quando, e só quando, a entrega é total o resto fica relativizado.

Por isso, quer tenhamos estado juntos ontem ou há dez anos, quer tenhamos trocado mensagens de parabéns ou nos esquecido, quer tenhamos estado lá na saúde e na doença, na pobreza ou na riqueza, não é de todo isso que importa. O que importa é a entrega. O que importa é dar tudo. O que importa é receber sem julgar. O que importa é a liberdade de cada um no ponto de contacto com o outro.

E eu adoro pessoas que se entregam. Seja qual for a história, seja qual for a bagagem, seja qual for o início. Só o facto de serem generosos o suficiente para se entregarem já me conquista.

Pode ser porque a vida é curta, pode ser porque a minha paciência se voltou para outras coisas, pode ser por todos e nenhum motivo. Simplesmente é.

O que não é, é fácil. Viver assim, com o coração permanentemente aberto, exposto, à mercê do mundo. E este coração meus caros, é bola de borracha usada, gasta, rolada por aí dos pés às cabeças, dos jogos à diversão, do esquecimento ao revivalismo. E à prova de quase tudo. Amolga-se e volta ao sítio, sofre com o chuto mas cumpre o seu destino, vai e vem vezes sem conta.

No final do dia cumpre. Entregou-se e viveu, sentiu e viveu, foi ao outro lado e voltou. Faz parte da vida vivida não ficar na prateleira. Não ter lustro, lugar cativo ou pó. E viver a vida é uma escolha diária — consciente ou inconscientemente — que só faz quem vai com tudo.

Tenho amigos perto e amigos longe, no tempo e no espaço. Amigos presentes e amigos ausentes, amigos para sempre e amigos por um dia. Tenho saudades de quem já não está e o coração partido porque se rendeu ao abandono. Mas todos os casos são sem sombra de dúvida ou pingo de hesitação amigos para a vida.

Por isso os reencontros são fáceis. Por isso os novos amigos são fáceis. Por isso os clientes já me disseram mais do que uma vez “nunca contei isto a ninguém”, “nunca senti vontade de partilhar isto” ou o clássico “não sei o que estás a fazer mas sinto-me bem a falar contigo”.

A única coisa que eu faço é dar tudo de mim sem pedir nada. E só isso basta para sermos amigos para a vida.

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